Ao ler este texto pensei em quantos casais que estão tomando a decisão da separação e precisam com muito carinho pensar que independente da dissolução do relacionamento conjugal, os filhos precisam se preservados mesmo que exista muita mágoas e ressentimentos, estes ferimentos emocionais não poderão ser transferidos aos filhos, vale a pena ler o texto abaixo.
Numa tarde de domingo, tinha eu dez anos, quando a minha mãe se sentou ao meu lado no sofá da sala e começou a chorar, para me tentar contar que o meu pai ia sair de casa e eles se iam separar. Perante aquela informação, passaram-me muitas perguntas pela cabeça, mas fiquei calado pois a minha mãe não parava de chorar e senti-me na obrigação de tomar conta dela, abraçá-la e dizer que ia ficar tudo bem. Mas não ia…!
Que eles iriam separar não era
novidade para mim, eu ouvia-os discutindo
no quarto há meses e meses, com insultos e ameaças de separação. Depois de
processar a informação que a minha mãe me tinha acabado de dar, primeiro,
fiquei chateado pelo fato do meu pai não estar presente e não ter tido coragem
para falar comigo sobre isso.
Segundo, o que realmente eu queria saber e ouvir era: “se fui eu o
culpado? “; “o pai deixou de gostar de nós?”; “como iria ser a minha vida daí
em diante ?”. As respostas a todas estas perguntas apareceram, gradualmente,
muito mais tarde e não da melhor forma possível.
Aquilo que pensava ser um tormento de discussões que naquele dia teria
terminado, era apenas uma ilusão porque a partir daí foi muito pior! No início,
pequenas atitudes inconscientes, da parte da minha mãe, denunciavam o decorrer
deste filme de terror. Atitudes como: no momento de ir para casa do meu pai, a
minha mãe ficava agarrada a mim durante imenso tempo e dizia que se eu
quisesse, ela ia buscar na casa do pai.
Sem ser propositado, era como se a minha mãe estivesse a dizer que o meu
pai não conseguia tomar conta de mim e que eu não ia gostar de estar com ele.
Quando eu voltava da casa do meu pai, a minha mãe fazia-me muitas perguntas e
todas as respostas que eu dava, ela contra argumentava: “já vi que
gosta mais de estar com o teu pai”. Estas pequenas atitudes, muitas vezes,
inconscientes por parte da minha mãe, foram tomando proporções
desmedidas.
As discussões pelo telefone aumentaram de tom, os insultos eram cada vez
piores e agora já era sobre mim, tudo na minha vida servia de desculpa para
eles discutirem, ainda mais do que antes da separação. Durante cerca de um ano,
ouvia a minha mãe chorar, ouvia a minha mãe pronunciar frases do genero: “o
teu pai não quer saber de nós”; “o teu pai não paga nada, sou eu que pago
tudo!”; “ele não quer saber de você , só da namorada nova”; “o teu pai não
gosta de voce e por isso destruiu a nossa família”. Frases como estas e
outras bem piores repetiam-se vezes sem conta na minha cabeça.
À medida que o tempo foi passando fui construindo uma ideia totalmente
errada e deturpada do meu pai. Não queria estar com o meu pai com medo de trair
a minha mãe. Eu estava muito triste e confuso porque toda aquela informação
negativa sobre o meu pai não correspondia à minha realidade.
Nos primeiros tempos que estive sozinho com o meu pai aos
fins-de-semana, eu adorei: passeámos muito, ele me fazia rir e estava sempre bem disposto. Era
uma sensação tão boa, que às vezes não queria voltar para casa, desejava ficar
mais tempo com o meu pai. Este sentimento contrastava com toda a informação
negativa da minha mãe. Eu simplesmente era criança e não percebia o que a minha
mãe, por vezes também inconscientemente, estava fazendo comigo e com ela
própria.
Eu vivi aquela tristeza com a minha mãe, como se o meu pai se tivesse
separado de mim também, como se o meu pai me tivesse trocado. Chorei com a
minha mãe, dormi com a minha mãe muitas noites para a acalmar, por fim assumi o
papel de pai e tomei conta dela.
Ao final de um ano, a angústia apoderou-se de mim. Com esta ambivalência
de pensamentos e sentimentos comecei a baixar as notas. Não tinha irmãos com
quem compartilhar a minha dor, tinha medo de cães, por isso não havia companhia
animal e tinha acabado de mudar para uma escola nova onde ainda não tinha
amigos porque passava os intervalos sozinho pensando em inúmeras coisas horríveis sobre
mim e sobre a vida.
Por fim, chegou o dia em que a minha mãe me levou a uma Psicóloga, que
depois de avaliar o meu estado emocional resultante, segundo ela, de uma
possível alienação parental, falou com a minha mãe. A minha Psicóloga deu
uma oportunidade à minha mãe para mudar a sua atitude e me colocar de novo em
contato com o meu pai. Foi um percurso longo, até tudo voltar a acalmar. Hoje
tenho 18 anos e deixo vários conselhos a todos os pais que se estejam pensando em separar:
No momento de separação:
·
É importante que sejam os dois a
conversar sobre a decisão
·
Nós não queremos saber com pormenor o
motivo da separação. Precisamos, isso sim, de informação reduzida e
simplificada;
·
Queremos saber se fomos ou não os
culpados;
·
Precisamos ouvir que a separação é definitiva e vocês já
não vão voltar mais a estar juntos;
·
Queremos ouvir que apesar de vocês se
separarem um do outro, não vão separar de nós e vão continuar a gostar de
nós;
·
Precisamos muito de saber como vai
ser a nossa vida daí para frente: o que vai mudar?; quanto tempo vou passar com
o pai?; como vão ser as férias e os aniversários?;
·
Por último: queremos que estejam
disponíveis para esclarecer qualquer dúvida que ainda possamos ter.
Após a separação:
·
Guardem para vocês todas as coisas
más que pensam um sobre o outro. Para sermos felizes precisamos de construir
uma imagem positiva dos dois;
·
Quando falarem mal um do outro, com
alguém ou ao telefone, tentem garantir que nós realmente não estamos ou não
conseguimos ouvir;
·
Não queremos servir de “espiões” da
vida de cada um de vocês e por isso dispensamos perguntas detalhadas sobre o
que fizemos em casa de cada um;
·
Tudo o que está relacionado com o
dinheiro, entendam-se! Quando somos pequenos, nós não precisamos saber se o pai
ou mãe não pagam o que devem;
·
Nós compreendemos a dor de vocês
e até podemos ajudar nas tarefas de casa, mas vocês
já são grandes para tomarem conta de vocês próprios emocionalmente, não
precisamos de viver as suas tristezas. Temos o direito de viver a nossa própria
tristeza e também, precisamos de tempo para nos adaptarmos a esta nova
situação;
·
Por fim, quando tiverem outra pessoa
na vossa vida – namorada(o), antes de nos apresentarem, tenham a certeza de que
há uma forte possibilidade de dar certo. Não precisamos de conhecer todos os seus namorados(as) porque: não vamos querer
dar confiança a uma pessoa que não sabemos se vai ou não desaparecer da nossa
vida; deixamos de confiar em vocês; e sobretudo, porque deixamos de acreditar
no amor!
·
Escrito por Joana Colaço
Psicóloga
com o mestrado em psicologia educacional, formação em terapia cognitiva e
comportamental com crianças e adolescentes, pós-Graduação em neuropsicologia
entre outras formações. Vive em Portugal. As crónicas têm o intuito de
partilhar com os pais, professores e todos os interessados, aquilo que pode ser
o ponto de vista de algumas crianças/adolescentes sobre os mais diversos temas
e problemas do mundo que os rodeia.
Ler mais: Psicologia do Brasil
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